INEBRIANTE NATURAL
A trufa é um fruto da terra conhecido de tempos muito antigos. Existem testemunhos da existência da trufa já em 1700-1600 a.C. Os gregos chamavam-na de 'hydon', os latinos denominavam-na de 'tuber' com raiz no verbo 'tumere' (inchar), os árabes 'ramech alchamec trufus', os franceses 'truffe', derivando do significado da representação teatral de Molière 'Tartufe' de 1664, os ingleses 'truffle' e os alemães 'Hirstbrunst' ou 'Truffel'. No século XVII já se organizam buscas de trufas, um divertimento palaciano para o qual cedo se escolheu um animal elegante como o cão para fazer a procura. No entanto, também o porco chega a ser utilizado com sucesso nesta procura. Muitos 'famosos' tinham na trufa um motivo de adoração: Alexandre Dumas definia-as como 'Sacra Santorum' do mês e Rossini como o 'Mozart dos fungos', Lord Byron tinha-as na secretária para que o perfume delas lhe despertasse a criatividade. Brillat Savarin defendia que as trufas deixam 'as mulheres mais carinhosas e os homens mais amáveis'.
Hoje em dia as trufas são motivo de leilão, atingem preços exorbitantes e ocupam o lugar de produto gourmet por excelência. Azeites trufados, molhos, conservas, manteigas, entre outros, tudo serve para aliciar os entusiastas - muitos deles fervorosos - deste túbero. A trufa é um fungo que vive sob a terra, precisamente em forma da túbero, constituído por uma massa carnosa revestida por uma cobertura. Apreciada pelo aroma e pelo sabor característico, a trufa possui proteínas, hidratos de carbono, água, gorduras semelhantes a outros fungos e com uma percentagem de água acentuada entre os 75% e os 90%. E, se o preço elevado leva a crer que a trufa possui elevadas qualidades nutricionais tal não acontece: é um alimento que pode ser consumido por pessoas de todas as idades.
A trufa é encontrada em maiores quantidades junto de árvores das quais absorve as características. A cor, sabor e perfume da trufa são determinadas pela árvore junto à qual se desenvolveu. Essas árvores são principalmente as seguintes: choupo, carvalho e tília. As trufas que crescem junto ao carvalho terão um perfume mais intenso enquanto as que crescem junto à tília serão mais claras e aromáticas. O seu perfume é uma mistura de alho, parmesão, musgo e gás. A forma, por sua vez, dependerá do tipo de terreno: a trufa é mais lisa quando o terreno é mais compacto e mais porosa se o terreno for mais irregular. No geral a maturação da trufa acontece no Outono, mas existem espécies primaveris. São conhecidas 32 espécies de trufas e apenas sete são consumidas, para os apreciadores existem somente duas, a d'Alba (Itália) e as do Périgord (França).A trufa preta onde nasce não deixa qualquer vegetação, o mesmo não acontecendo com a branca (cor de mármore sujo). A trufa branca difícil de encontrar, atinge neste ano de 2005, cerca de 5.000 euros o quilo.
QUASE DOIS MILÉNIOS NA EUROPA
Durante quase dois milénios, o centro da Europa era o núcleo comercial da trufa, no entanto estava anteriormente presente em muitas culturas da época pré-histórica. Segundo os antigos Romanos as melhores trufas encontravam-se na Grécia e na Líbia e, para Bartolomeo Paltina, médico no ano de 400, já se encontravam em África, Síria e também na Grécia. No Oriente crê-se difundida na China e no Japão e presume-se que mesmo os nativos americanos conheceram a existência da trufa, mas não existem provas contundentes. Na Europa eram famosas as da Provença - Périgord da Borgonha. Na Alemanha descobriram-se, no ano de 700, nas zonas de Brandenburgo e Saxónia e, em Itália, a trufa preta estava presente em quase todo o território, sendo todavia criado um mercado internacional nos anos 800, sempre em seguimento da França. Este discurso gera divergências entre Itália e França, como acontece com os vinhos também, porque se do ponto de vista comercial a trufa estava vulgarizada em França e em Itália, no baixo Piemonte, na época medieval, a trufa branca era já considerada como fundamental na alimentação entre as famílias nobres. Piemonte é, desde há muito, de facto, uma região onde o consumo é uma realidade e se os franceses procuravam mais a trufa preta, em Piemonte o consumo da trufa branca já era fortemente vulgarizado. Durante largos anos julgara-se que a trufa, por estar próxima dos cogumelos podia absorver o respectivo veneno. Na Europa do passado a trufa chegou a ser apelidada de 'alho dos ricos' pelo sabor e naturalmente porque se encontrava em abundância. Todavia, também é referido, por vezes, que Piemonte começou o consumo imitando os hábitos franceses que já utlizavam as trufas nas carnes e peixes. Bem, a paixão gastronómica que despertam as trufas explica estas 'picardias' e deve-se em grande parte aos perfumes que estas emanam. As diferenças botânicas entre a trufa negra e a trufa branca são mínimas, no entanto, na cozinha as duas distinguem-se claramente segundo um príncipio essencial: a trufa preta é consumida em quantidade enquanto a trufa branca é mais um aromatizante que transmite sobretudo um perfume e que é empregue em doses mínimas. As outras diferenças são que a trufa preta é consumida cozinhada e a branca quase exclusivamente crua, ralada directamente sobre o prato. As trufas brancas são uma 'benção' quase exclusiva em algumas regiões de Itália, sobretudo Piemonte, Emiglia Romana, Marche Umbria, Abruzzo, Molise, Basilicata e Calabria, nestas regiões também é possível encontrar a trufa preta. Apelidado de 'tartufaio', pelos italianos, o cão 'trufeiro' experimenta a sorte de ser treinado para encontrar o precioso túbero. O 'tartufaio' é treinado para agir dentro do respeito absoluto da natureza. Depois de identificar a zona onde se encontram as trufas deve escavar e fazer a recolha das trufas.
Se a busca se faz hoje sobretudo com cães e já se fazia em 1.700 a. Cristo, também o porco chegou a ser utilizado nesta procura: no século XVI esfregavam as tetas da porca com um pouco de sumo de trufa e, sendo este um animal de faro privilegiado, conseguia encontrá-las, isto apenas se fazia com porcos de três meses a um ano.
Para escolher a trufa para já o perfume é primordial: se o perfume não chegar ao nariz mesmo á distância, poderá ser trufa velha ou originária da China, Eslovénia, ou até mesmo de outras regiões de Itália.A trufa preta tem uma aroma menos intenso que a branca, e até diferente, tem um aspecto de mármore negro quando cortada.O paladar é uma mistura de avelãs, castanhas, nozes e terra. A trufa preta é cultivável e leva uns oito anos a criar-se. A trufa preta vale menos cinco vezes o valor da branca.A trufa preta francesa é a melhor.
A conservação das trufas pode ser feita de várias formas. Convém utilizar um recipiente de fecho hermético para não perder o perfume. Antes de serem colocadas em recipientes devem ser limpas com uma escova de dureza média para eliminar a maior parte da terra e com um pano retirar o resto, tudo com delicadeza. Depois é cobri-las com arroz para não perderem a humidade e mantê-la constante, sendo recuperadas somente no momento do uso. Este arroz é depois utilizado para fazer óptimos 'risotti' devido ao facto de ter absorvido todos os aromas das trufas.
O 'TARTUFO D'ALBA'
Foi em 1929 que Giacomo Mora tentou, pela primeira vez, divulgar a trufa numa exposição na Feira d' Alba (Piemonte), mostrando as melhores trufas que cosneguira. O sucesso foi tal que decidiu continuar nos anos seguintes e naturalmente a adesão por parte dos visitantes foi crescendo. Em 1930 uma edição de 'The Observer' dedicou um artigo extenso à Feira d'Alba no qual a trufa ocupava um lugar de destaque. Em 1933 a Feira foi rebaptizada Feira da Trufa e, pela primeira vez, os vinhos locais como o Barolo, Barbaresco e Espumante Asti associaram-se ao produto trufa. A Feira foi inaugurada em 1936 por Umberto de Savoia e, em 1937, dura apenas três dias devido à Guerra. Em 1945 é retomada e, nos anos 50, tem por intuito promover os produtos de Alba, assim como as novas indústrias, actividades comerciais e agrícolas. As manifestações paralelas à Feira assumiram com o passar do tempo grande importância como, por exemplo, concursos de pintura ou reconhecimento de monumentos.
Um restaurador italiano, Giacomo Mora, teve um papel primordial na internacionalização da trufa, criando um verdadeiro culto em relação à trufa que resolveu chamar 'Trufa d'Alba'. Em 1949 no âmbito de um evento enogastronómico, resolveu oferecer a Rita Hayworth o melhor exemplar recolhido nesse ano. De então em diante o episódio repetiu-se, associado sempre a personalidades de relevo internacional, a saber: Harry Truman, Winston Churchill, Joe Di Maggio e Marylin Monroe, o Imperador da Etiopia Hailé Selassiè, o Papa Paulo VI, Sofia Loren, Alfred Hitchcock, Ronald Reagan, Gianni Agnelli, Gorbachov, Pavarotti, Valentino, o Príncipe Alberto do Mónaco, João Paulo II...