sábado, 5 de junho de 2010

SÉRIE ARTE E SABOR

Gérard Poulard _ Maître Fromagier




O saber da escolha


Gérard Poulard, Maître fromagier, passou por Portugal, apresentando uma pequena parcela do maior embaixador da cultura francesa, os queijos. Trouxe 110 variedades consigo e deixou algumas recomendações para melhor degustar o produto.

O Maître fromagier, Gérard Poulard, esteve em Portugal, no Hotel Pestana Palace, para mostrar uma variedade de 110 queijos, que trouxe consigo de França. Na sua próxima visita, espera trazer mais, já que a França tem uma produção de cercad de 1800 variedades. Para a apresentação, contou com o patrocínio da TAP e da embaixada de França.

Nascido em Lyon, começou a trabalhar aos 14 anos, na hotelaria. Tem formação de cozinheiro. Deixou a cozinha por questões de saúde e foi para a sala. Lá exerceu todas as funções, até descobrir a sua vocação, dando asas à sua paixão pelos queijos.

«Tive a ideia de cuidar do queijo». Uma ideia que fez rir alguns colegas de trabalho, mas que só lhe deu mais motivação para seguir com o projecto. Foi no hotel Le Meridien, em Paris, que expôs a mesa de queijo, única classificada no guia Michelin. Apresentou logo algo de original: juntamente com os queijos adicionou todas as informações que o identificassem, desde a origem à produção em si. «Fiz tudo por iniciativa própria, sem pedir nada a ninguém».

Na cozinha do Pestana Palace, apresentou queijos raros, que quase não se encontram no mercado. “Cône du Morvan”, um queijo de cabra que ganha bolor. Esse bolor é o mesmo que encontramos no salpicão, por exemplo. Mesmo o cheiro do queijo é igual ao do salpicão e da charcutaria. Apresentou também o chamado anel de Deus, que é um queijo de cabra. De acordo com o Maître, os queijos de cabra, que vêm da região de Provence são trabalhados com lavanda, combinam com vinhos brancos portugueses. O “Epoisses” é um queijo DOP (Denominação de Origem Protegida), que existe há muitos anos. É da Borgonha e é um queijo que combina na perfeição com os vinhos portugueses com corpo. No entanto, lamentou-se por não encontrar nos restaurantes, «uma apresentação de cerca de 20/30 queijos. Infelizmente os restaurantes não o fazem, porque é bastante caro». Por esse motivo é que provavelmente não há lojas de queijarias em Portugal, porque com as taxas incluídas, o produto tornar-se-ia muito caro.



O que é um Maître fromagier?
Ser fromagier corresponde ao sommelier do vinho, mas desta feita em relação aos queijos. Isto significa que se faz um acompanhamento da produção desde a selecção não só do leite, mas de toda a alimentação, a ração do animal. O Maître fez questão de sublinhar que a questão da alimentação é fundamental, porque é através dela que o leite varia, e daí a variação na produção dos queijos. Por exemplo, a erva é importante, as estações do ano são importantes, até mesmo a composição do solo tem importância na produção de um bom queijo, porque em função do solo, a erva pode ser completamente diferente, tal como aliás acontece com o vinho. Gérard Poulard é portanto categórico na afirmação que acompanha toda a
produção do queijo. O produtor está sempre em primeiro plano. O objectivo do fromagier é dar uma identidade ao produto. «Nós [fromagiers] colocamos uma carta de identidade ao produto. É aqui que podemos diferenciar um fromager de um fromagier. O fromager apenas produz o queijo, sem ter em conta todos os requisitos que nós, fromagiers, temos».

Pois além de vender queijo, a função do fromagier também engloba missões culturais, como ir ao estrangeiro, onde fazem associações com os produtos locais. «Aqui em Portugal, associámos ao vinho. Na China, por exemplo, associamos, curiosamente, com o chá». Mesmo que isso possa fazer sorrir alguns franceses, a verdade, reafirmou o Maître, é que o chá combina na perfeição com os queijos.

Organizam eventos, onde põem à disposição pacotes com os produtos. Depois cabe ao restaurador revender esse pacote, individualmente. Fazem um lote, com um determinado preço, que depois é aceite ou não. Afirma que os seus principais clientes são cadeias hoteleiras, companhias aéreas e empresas privadas. No entanto, acrescenta, ainda, que «já aconteceu ir ao outro lado do mundo para realizar uma noitada». Já percorreu vários países e em Paris organizam noitadas, para eventos em que o tema central é o vinho e o queijo. «Tentamos sempre utilizar o do país onde estamos, não levamos vinhos, só se forem requisitados». No entanto, afirma que o objectivo não é o de destacar os vinhos franceses, mas sim o queijo.


Não há muitos fromagiers. Os franceses são os únicos, porque «fomos nós que registámos este nome, tal como o nome de sommelier do queijo». Têm o seu trabalho, com os produtos, concentrado em Ringis, Paris. Trabalham directamente com os produtores, que fornecem os queijos. Sabem como trabalham, uma vez que acompanham a produção. Também têm atenção ao processo de transporte, que deve ser extremamente cuidadoso: os queijos vão directamente da sua sede para os transportadores, onde são conservados nas melhores das condições. Depois são transportados por avião, directamente para o país de destino, devidamente embalados.

Apresentar um queijo
Quem apresenta os queijos também deve ter formação, deve saber de onde vem o queijo que está a vender, conseguindo falar sobre ele. É preciso depois tratar e cuidar dos queijos. Não podem misturar os queijos todos, por exemplo.

Não pode ser o sommelier, porque ele trata é do vinho. Não pode ser a cozinha também, porque não têm tempo para isso. O serviço de sala é que deve ter essa preocupação. Deve ser o Chefe de mesa, por exemplo, a fazê-lo. Duas dezenas de queijos são o suficiente.


Confrontado com a questão da gordura no queijo, afirma exasperado que «não se pode confundir tudo». O queijo tem 45% de matéria gorda, depois depende da concentração. Não podemos misturar a medicina e os queijos. Pode haver pessoas que não possam comer queijos, mas são casos pontuais. Mas para quem quer ter esses cuidados todos, o queijo de cabra é melhor que o de vaca. Porque, no caso do queijo de vaca, guardamos toda a gordura.

Descoberta da cultura francesa

Uma vez que a França tem uma produção de cerca de 1800 variedades de queijos, o que o Maître se propôs foi uma apresentação de uma parte considerável que a cultura francesa encerra. Afinal a França é conhecida pelos seus queijos. Os queijos DOP garantem um savoir-faire e a região. A qualidade já é outra coisa. É preciso ler as etiquetas. É importante que o consumidor pergunte qual a origem do queijo que está a consumir.

A identificação de um bom queijo
Na identificação de um bom queijo, Gérard Poulard faz sempre um paralelismo com o vinho, porque os procedimentos são os mesmos. Quando um escanção agarra num copo de vinho e o observa, o mesmo faz o fromagier com o queijo. «Quando temos um queijo em frente, temos de trabalhar todos os nossos sentidos». Em primeiro lugar olha-se e procura-se identificar o que não está bem. Cita o exemplo do camambert que não pode ser pegajoso, nem viscoso, por exemplo. «Depois da observação, agarramos, sempre que possível, e analisamos a textura».
Em seguida corta-se. Há uma maneira para o fazer, parte-se sempre do centro para o exterior. É assim a boa maneira de cortar um queijo. Não pode ser uma faca de dentes, mas sim uma faca com uma lâmina fina. Também, não se pode retirar a casca.
Para degustação, o processo é diferente. Corta-se a meio, para ver de que categoria é e se não há nenhuma anomalia na massa. Aqui tudo depende do tipo de queijo. Para o “Époisses”, por exemplo, a massa deve colar à faca. Para o camembert e o queijo de cabra, já não pode colar à faca. «É muito importante escolher uma boa faca para cortar. Tal como nos vinhos, é preciso um bom saca-rolhas, para não estragar». Já para um queijo pasteurizado, não é preciso todos estes requisitos.
Depois disto tudo, há um barómetro na cor. Para o quejo de cabra, é sempre branco. Para os de vaca, é cor marfim. A massa também deve ser cheirada, «é aqui que somos sommeliers». Os cheiros à superfície não correspondem à massa. Há uma grande finesse na matéria interior, enquanto que a crosta é mais rústica.



As recomendações do Maître

Para degustar um queijo, não se deve escolher grandes vinhos. Poquê? «Porque é uma pena tanto para o vinho, como para o queijo», explica. O melhor é escolher um vinho razoável. Um bom vinho, como um vinho branco para os queijos de cabra.
Os vinhos tintos combinam na perfeição com queijos com carácter, como o “Epoisses”, por exemplo. Também se pode beber cerveja com queijos do Norte. A cidra combina com alguns queijos. Mas já o Champanhe é absolutamente proibido com o queijo. O champanhe é um vinho de festa. «É ridículo beber champanhe com a sobremesa, por exemplo». Já o vinho do Porto combina na perfeição com os queijos bleus (os que têm bolor, por exemplo).











SÉRIE GRANDES CHEFES

CLAUDE TROISGROS



O TROISGROS QUE MUDOU A COZINHA BRASILEIRA
Nascido em Roanne em 1956, Claude Troisgros carrega um dos nomes mais conhecidos e prestigiados da cozinha mundial. O seu pai Pierre e o seu tio Jean (morreu em 1981) foram, ao lado de Paul Bocuse e Michel Guérard, os nomes principais da Nouvelle Cuisine. O seu irmão Michel é hoje aclamado como um dos grandes chefes do mundo, continuando a tradição das três estrelas Michelin no restaurante da família. O caminho de Claude foi outro, mas nem por isso menos importante. A sua ida para o Brasil, país que adoptou como seu, acabaria por se revelar fundamental para a renovação da cozinha brasileira. Hoje, o seu pioneirismo é reconhecido por uma série de chefes brasileiros, com Alex Atala à cabeça, que começam a dar nas vistas a nível mundial, trazendo produtos tropicais (com especial destaque para os da Amazónia) para pratos de vanguarda. Vinte e cinco anos depois de abrir o seu restaurante no tranquilo bairro carioca do Jardim Botânico, Claude Troisgros é já um clássico, autor de receitas marcantes como a codorna FHC, ou seja, uma codorniz recheada com farofa com molho de jabuticaba (uma fruta tropical) com que homenageou um dos seus muitos e ilustres clientes, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Um prato que é um bom exemplo da maneira como ele cozinha, partindo de uma sólida base técnica, de raiz francesa, para a exibição dos sabores brasileiros. Esta entrevista foi-nos concedida durante a semana gastronómica que Claude Troisgros fez no hotel Lapa Palace, em Lisboa, no âmbito da iniciativa Encontro com Grandes Chefes do Mundo. E que acabaria por ser também um momento de encontro familiar, já que o seu filho Thomas, também cozinheiro, veio com ele e o pai, Pierre, juntou-se a eles vindo de França. Uma ocasião feliz para uma família que transmite uma simpatia e uma abertura de espírito notáveis, de quem vê o mundo como a sua casa, sempre com curiosidade para conhecer outros modos de viver e de cozinhar.

É difícil ser-se herdeiros de uma família tão ilustre?
Realmente, dá-nos uma certa responsabilidade. O meu avô Jean-Baptiste e a minha avó Marie abriram o restaurante em 1930. O meu avô foi um revolucionário, na altura, servindo em pratos e não em travessas. Falava aos filhos (Pierre e Jean): “vocês têm que ser responsáveis pelas vossas receitas do principio até ao fim”. E ele começaram a empratar tudo. Como ele odiava pão, começou a colocar aquelas colheres de sopa rasas para se poder provar o molho sem precisar do pão. Ele era borgonhês e muito ligado ao vinho e começou a servir Beaujolais com peixe…. A minha avó tinha receitas inacreditáveis para a época como linguado com banana, muito exótico e caro porque a banana era cara e difícil de encontrar. Eu nasci nesse meio, quando o meu pai e meu tio participaram na revolução da Nouvelle Cuisine…

Como é que viveu essa época?
Moravamos dentro do hotel, do restaurante, e havia uma grande amizade com Paul Bocuse (até hoje, Pierre Troisgros telefona quase todos os dias a Bocuse), Roger Vergé, Michel Guérard, Alain Chapel, enfim, os grandes nomes da cozinha eram visitas frequentes lá de casa. Tinha 10, 12 anos e acompanhava esse ambiente de alta cozinha. Foi uma lavagem de cérebro positiva para mim e o meu irmão Michel (dois anos mais novo).

E sempre quis seguir a tradição da família?
Sempre. Nem tive muita escolha, porque logo aos seis anos assinei um contrato para ser aprendiz no Paul Bocuse assim que tivesse idade. Era uma brincadeira, é claro, com um grande amigo da minha família, mas a verdade é que aos 16 anos fui para lá aprender. Foi o meu primeiro restaurante. Mas o meu pai quis que eu e o meu irmão vivêssemos diversas experiências antes de nos fixarmos em Roanne, Depois do Bocuse, estive com Joe Rostang, (pai de Michel), no Taillevent (em Paris), em Londres, na Alemanha, na Irlanda, Passávamos lá uns tempo e depois voltávamos sempre uns meses para casa, porque ia-mos ser os herdeiros.

Quando é que essa fase se encerrou?
Em 1978, voltei para casa para ficar e continuar a tradição. O meu irmão dois anos depois. Só que aconteceu um momento crucial na minha vida: em 1979 o meu pai entrou na cozinha e disse que o Gaston Lenôtre estava a abrir o Pré-Catelan num hotel do Rio de Janeiro (o Rio Palace) e precisava de um chefe para um contrato de dois anos. Eu disse logo que adoraria conhecer o Brasil, Copacabana, mulatas, samba. Tinha 22 anos, maravilha. Assinei o contrato e nunca mais voltei, apaixonei-me pelo Brasil, por uma brasileira, a minha vida mudou completamente.

Mas foi fazer cozinha francesa?
Fui. Era o que eles queriam, na altura, no Rio. Aliás, cheguei ao mesmo tempo do Laurent Suedeau, que ia mandado pelo Paul Bocuse, para o restaurante do Méridien, onde ele era consultor. Não podíamos criar a nossa cozinha, só executavamos as receitas dos chefes para que trabalhávamos. Alguns meses depois, liguei para o Lenôtre e disse que o restaurante estava a dar muito certo mas que o caminho era errado porque não era isso que eu aprendi, que o meu pai me ensinara. A gente não estava trabalhando com produtos frescos, com produtos da estação, era tudo congelado, importado, enlatado. Ele me respondeu que ele estava na França e eu no Brasil, que tinha confiança em mim e para eu fazer o que bem entendesse. E o mesmo aconteceu entre o Laurent e o Bocuse. Nós começámos então a criar uma cozinha personalizada, usando produtos da estação, do mercado, que eram produtos tropicais, como maracujá e outras frutas. Comecei a incorporar os produtos brasileiros na cozinha francesa, sem saber muito bem na realidade o que estava a fazer. Mas criámos uma nova era na cozinha brasileira.


Os brasileiros, que estavam à espera de cozinha francesa, reagiram bem?
Nem sempre e eu tive uma fase difícil, porque o paladar dos brasileiros não era muito bem formado. Havia um pequeno grupo de pessoas que viajava e que conhecia uma culinária mais moderna. Mas durante dez anos sofri muito, com os clientes a pedirem arroz com todos os pratos. Foi uma fase difícil, mas importante.



O nome Troisgros não o ajudou quando decidiu abrir o seu próprio restaurante?

A maioria das pessoas no Brasil não dava importância ao nome Troisgros, só os mais viajados. Abri um pequeno restaurante no Leblon, o Roanne, tinha pouco dinheiro e o meu pai não me quis ajudar (ele queria era que eu voltasse para casa...) e fez muito bem porque eu tive que me virar como podia. Era 30 m2, com 18 banquinhos sem encosto. Nos dois primeiros dias não tivemos ninguém, mas no terceiro dia entrou um cliente sozinho que comeu e gostou muito. Me deixou o seu cartão, disse que estava muito bom, muito obrigado, vou te mandar muitos clientes. Eu achei que era daquelas coisas que se diziam, mas que não tinha significado. Só que conversa vai, conversa vem, ele viu o nome Roanne e perguntou se eu era de lá dizendo que ia lá muito, por causa de um restaurante Troisgros que adorava, etc. Esse primeiro cliente era uma pessoa que na altura era o manda-chuva da gastronomia carioca, o Boni, director da Rede Globo, um grande gourmet e muito influente. Ele realmente ele começou a mandar muita gente da Globo. Um ano depois eu tinha dinheiro para abrir o restaurante que tenho até hoje que se chamava Claude Troisgros e agora se chama Olympe, o nome da minha mãe.

E nunca pensou em voltar para Roanne?
O meu irmão voltou em 1981 e ele toma conta da casa, com muito sucesso por isso estou tranquilo nesse aspecto. Mas houve um época, em 1991, em que havia muita violência e sequestros no Brasil e eu, com medo do que poderia acontecer à minha família, decidi voltar para Roanne. Deixei o restaurante aberto com o meu pessoal. O meu pai adorou ver os dois irmãos juntos, mas o Michel já estava dez anos à minha frente e eu senti muita saudade do Brasil. Não estava na mesma sintonia. Tive a proposta de abrir em restaurante em Nova Iorque e fiquei lá seis anos. Fui consultor, deu certo, mas um dos sócios brasileiros decidiu vender e eu voltei ao Rio.

Não sente que, por estar longe de França e da Europa, está a ser ultrapassado em termos técnicos?
Sinto que no Brasil posso estar a ser ultrapassado em termos técnicos, mas viajo muito, dou consultoria em Miami ), num restaurante de alto padrão. (o Blue Door, desenhado por Philippe Starck, que tem Madonna como um dos sócios), vou também ao Japão (os Troisgros têm lá uma loja gourmet desde os anos 60), a Singapura, ou seja, viajo sempre que posso, às vezes até sem cobrar, porque aprendo muito. Se não viajar, fico desfasado.

Acha que a base técnica foi o mais importante na sua carreira?
A base técnica é indispensável. Tirando os orientais, a base é francesa, mesmo nos novos espanhóis. Como na música ou na pintura você tem que ter uma base clássica, senão o que vai criar é uma confusão generalizada. Mas não se aprende só em França. Aliás, o meu filho Thomas, tal como o filho de Bocuse, foi para os EUA, para o CIA (Culinary Institute of América, hoje em dia, uma das mais prestigiadas escolas de cozinha do mundo), por uma razão: tecnicamente falando as escolas francesas são melhores, mas as americanas, sobretudo o CIA, tem uma abertura de espírito maior do que as francesas. Em França, fala-se só de cozinha francesa. Nem sequer da italiana.

Como é que alguém que acompanhou tão de perto o movimento da Nouvelle Cuisine vê a cozinha actual?
A Nouvelle Cuisine foi a maior mudança que a cozinha teve. Veio depois a fusão, que começou nos EUA e se generalizou, mas agora o Ferran Adrià lançou uma nova era, principalmente com uma técnica muito forte, muito sólida. É a evolução do que aconteceu há 30 anos atrás. E vai aparecer uma outra, vai evoluir ainda mais, é só o início de uma nova culinária.

Então para si o Adrià não é apenas uma moda?
Não, não é passageiro, é muito forte, embora, é claro, como aconteceu com a fusão nos anos 90, vai evoluir muito também. Mas vão sempre aparecer alguns chefes que vão fazer umas misturas que não têm nada a ver uma coisa com a outra. Mas o Adriá e outros chefes, como o meu irmão ou o Pierre Gagnaire, por exemplo, vão certamente continuar a evolução.

E no Brasil?
Tecnicamente, os cozinheiros evoluiram muito, o paladar do cliente brasileiro evoluiu muito, as pessoas estão muito ligadas a gastronomia, fazem aulas. Vejo o início de uma grande mudança na gastronomia brasileira, com a valorização dos produtos do país, como, por exemplo, os da Amazónia.

A qualidade dos novos chefes brasileiros é boa?
Há dez anos atrás só tinha franceses, italianos, alemães. Agora tem uma nova era com o Alex Atala, a Flávia Quaresma, a Carla Pernambuco. E vai crescer. As escolas de cozinha, sobretudo no Rio e S. Paulo, estão também melhorando a qualidade das equipas. E agora há bons produtos para trabalhar. Quando cheguei, não havia quase nada em produtos de qualidade. Tomate, cenoura, courgette, beringela, cebola e acabou. Agora tem espargos, foie gras, ervas aromáticas, eu sei lá. Mesmo nos produtos daqui, como a fruta tropical, há mais variedade e qualidade. E toda a gente se preocupa com a qualidade do produto. Portanto, estamos no início de uma grande evolução.

Não há muitas rivalidades entre os chefes brasileiros?
Nunca senti. Talvez por ser um país de imigrantes, sempre me aceitaram muito bem e tenho entre eles muitos amigos. Acho que tem a ver com o espírito brasileiro. Os chefes brasileiros são como uma grande família.

Já conhecia Portugal?
Esta é a terceira vez que venho. A primeira foi porque o Miguel Reino, que há 25 anos trabalhou uns meses comigo no Rio, convidou-me para o seu casamento em Portugal. Lembro-me de ir ao restaurante dele, Aqui Há Peixe, para almoçar e foi inesquecível. Óptimo peixe e mariscos, tudo com uma cozinha muito simples, mas muito bom. No ano passado, o meu pai recebeu a Legião de Honra e quando eu quis ir a França, já não havia passagens. Mas havia vindo por Lisboa e eu vim com a minha mulher. Aproveitámos para tirar uns dias, alugar um carro e ir até Évora, meio na aventura, sem nada planeado. Foi uma surpresa, porque é uma região lindíssima, comida muito boa, restaurantes pequeninhos mas maravilhosos, vinho bom…E aí eu comecei a compreender melhor porque o brasileiro é tão feliz. É porque o português é um povo feliz, acolhedor, sorridente. Eu me apaixonei por Portugal.

E esta experiência agora a trabalhar no Lapa Palace?
Claro que em trabalho não é a mesma coisa, mas este hotel é fantástico, de alto luxo, com uma clientela mais sofisticada. Como vim também fazer umas filmagens para o meu programa no GNT (canal brasileiro de televisão por cabo) isso deu-me possibilidade de conhecer algumas coisas que eu queria, como o queijo de Azeitão. Fomos lá na Quinta do Anjo, com o Sr. Fortuna, uma grande personalidade e um queijo sensacional. É, juntamente com o queijo da Serra da Estrela, um dos grandes queijos do mundo. Fomos também ao mercado de peixe em Setúbal e conheci também umas coisas que nunca tinha visto como choco. Tem na França, mas não é muito normal, tem que se fazer um pedido especial. Fiz até uma receita com a tinta do choco. Comprei percebes, que acho muito interessantes. Tem também na França mas não usamos muito. E enguias vivas, raias, peixe muito fresco. Gostei muito daquelas portuguesas que vendem o peixe, cortam o peixe, limpam, falam, riem. É um ambiente fantástico. Fui ainda à Tasquinha da Adelaide. A Adelaide é uma graça de pessoa e fiz com ela um prato tradicional, o bacalhau espiritual.

Quais são os próximos projectos?
Estou abrindo no Rio um novo restaurante, onde era o Boteco 66, que reformulei para o 66 Bistrot, com o meu filho Thomas e a minha prima Natalie, com uma base de cozinha francesa, com muitos assados, peixe ao sal, etc. E vamos recordar um serviço que desapareceu, com a finalização dos pratos na sala, os flambées, o lado espectacular. Ou seja, a cozinha pré-Nouvelle Cuisine.

Aos 50 anos, não está cansado de cozinhar?
Não, não. Ao contrário. Agora, no Brasil, este estilo de cozinha está a crescer. Nos últimos cinco anos, muitos chefes avançaram um pouco mais nesta cozinha, digamos, “franco-brasileira” e vai crescer ainda mais, o que para mim é óptimo. É um estímulo vir gente mais nova fazer este tipo de cozinha.

O seu nome vai ficar mais ligado a França ou ao Brasil?
Acho que claramente ao Brasil. Eu sinto-me sobretudo um divulgador da cozinha brasileira e dos seus produtos

SÉRIE GRANDES CHEFES

 Emmanuel Bassoleil




Um dos mais importantes chefs da atualidade, Emmanuel Bassoleil contribui, enriquece e influencia a gastronomia no País, em mais de vinte anos de atividades – de chef proprietário do Roanne por 14 anos, a passagens nos mais importantes e estrelados restaurantes franceses, trabalhando com nomes consagrados como Lameloise, Troigros, Lenôtre, entre outros.

À frente como chef executivo do “Hotel Unique e do Restaurante Skye”, desde sua inauguração em 2002, Bassoleil comemorou em 2006, a eleição do Skye como um dos 9 melhores restaurantes de hotel do mundo pela revista Hotel’s Magazine.

Em 1994 lançou o livro “Uma Cozinha sem Chef”, pela DBA Melhoramentos e, em 2006 “Sabores da Borgonha”, pela Editora Senac São Paulo. Em 1995 foi um dos fundadores da ABAGA - Associação Brasileira da Alta Gastronomia -, da qual foi vice-presidente por 7 anos e em 1998 o primeiro chef no Brasil a receber a “Ordem da Academia de Culinária da França”. No ano anterior participou com outros três chefs do “Eurotoque” - confraria que destaca os melhores profissionais europeus que trabalham em outros países.


Chef francês há mais de 20 anos no Brasil, Emmanuel Bassoleil prepara pratos franceses adaptados ao paladar brasileiro.


Um dos mais importantes chefs de cuisine da atualidade, Emmanuel Bassoleil contribui, enriquece e influencia há mais de duas décadas a gastronomia no País. Da Escola Técnica de Hotelaria de Dijon, em 1977, diretamente para as cozinhas do mundo, Bassoleil acumula o aprendizado de 3 tipos de cozinhas diferentes - a clássica, regional e la nouvelle cuisine passada pelas mãos de chefs estrelados do Guia Michelin como Jacques Lameloise, Gaston Lenotre e Pierre Troigros – e duas voltas ao mundo no currículo até tornar-se chef-proprietário do restaurante Roanne, em São Paulo.

Atualmente à frente como chef executivo do “Hotel Unique e do Restaurante Skye”, também em São Paulo, desde sua inauguração em 2002, o prêmio de um dos melhores restaurantes de hotel do mundo não demorou a chegar: em 2006 figurou entre os 9 melhores, eleito pela revista Hotel’s Magazine.

No Brasil desde 1987 após trabalhar nos mais importantes restaurantes da França, Emmanuel Bassoleil amadureceu e refinou seu talento em contato com a atmosfera de um país tropical. Resultado disso veio em 1993 com o título de Chef do Ano, honraria conferida pelo rigoroso Guia 4 Rodas, acompanhado da 3º estrela concedida ao restaurante Roanne, que passou a figurar entre os top do Brasil.

Como um dos criadores da ABAGA - Associação Brasileira da Alta Gastronomia, cujo objetivo principal é incentivar e valorizar os profissionais da área - da qual foi vice-presidente por 7 anos, Bassoleil foi primeiro chef no Brasil a receber a “Ordem da Academia de Culinária da França”, ganhou em 2001, o segundo prêmio de Chef do Ano, passando pelo Mérito Profissional em Gastronomia pela Academia Brasileira de Arte Cultura e História, prêmio Food Service Nutri News, Projeto Gastronômico Bassoleil, Top of Business - os melhores do ano de 2002 e Personalidade da Gastronomia, em 2004, pela revista 'Prazeres da Mesa’.

Com portas abertas na mídia brasileira pelos mais variados segmentos, Bassoleil é considerado hoje um profissional completo com 2 livros publicados: ‘Uma cozinha sem Chef”, pela DBA Melhoramentos, em 1994 e ‘Os Sabores da Borgonha’, pela Editora Senac São Paulo, em 2007, além de diversas participações nas principais publicações nacionais.

Curtas:

Deu duas voltas ao redor do mundo trabalhando como chef em um navio de Cruzeiro;

Duas vezes premiado como “Prêmio de Melhor Chef do Ano” (1993 e 2001) pelo rigoroso Guia 4 Rodas, prêmio que concedeu ao restaurante Roanne, o qual dirigia a cozinha na época, a 3º estrela passando a figurar entre os top do Brasil.

Em 1998 foi o primeiro chef no Brasil a receber a “Ordem da Academia de Culinária da França”.
Recebeu a comenda do “Mérito Profissional em Gastronomia 2002” pela “Academia Brasileira de Arte Cultura e História”;

Ganhou os prêmios “Food Service Nutri News 2002” pelo “Projeto Gastronômico Bassoleil” e o “Top of Business”, os melhores do ano de 2002;
Recebeu da revista Prazeres da Mesa o prêmio “Personalidade da Gastronomia 2004”;
Foi Sócio Proprietário do “Bar Azucar”, do “Bar Restaurante Azur” e Diretor Superintendente da “Chefe Cook Assessoria de Cozinhas S/C Ltda”.



SÉRIE GRANDES CHEFES

Laurent Suaudeau

"Genialidade é superar-se a cada dia"


Com ousadia, criatividade e, acima de tudo, competência, Laurent Suaudeau enaltece de maneira inédita e extremamente saborosa o traço que melhor representa a cultura de um país: a sua cozinha.

Ao unir duas nações como França e Brasil, o resultado não poderia ser mais espetacular. Da entrada à sobremesa, as suas receitas surpreendem e reinventam o sabor, que se traduz em forma, beleza, espírito e desejo.

Nascido em Cholet, Vale do Loire, na França, em 1957, a trajetória profissional de Laurent começou cedo, aos 15 anos de idade. Apoiado pelo pai, decidiu abandonar a escola tradicional e ingressar na carreira de cozinheiro, atendendo a uma vocação revelada desde a infância.

Encontrou no "Lucullos" uma oportunidade de trabalho e um grande mestre - Jean Guerin, que foi seu professor no Lycée e o responsável por despertar em Laurent uma habilidade muito especial: adivinhar, da cozinha, o que estava acontecendo no salão.

Guerin ofereceu a Laurent sua terceira oportunidade de trabalho. Foi em um restaurante de primeira linha, o "Les Prés et les Sources", do chef Michel Guérard. O ambiente muito competitivo não permitia companheirismo, e assim estava inaugurado na vida do jovem cozinheiro o rigoroso profissionalismo.

Quando a sua carreira tomava impulso, veio a convocação militar - um contratempo que acabou mostrando-se valioso para Laurent. Perto de deixar o quartel, apostou alto e tentou uma vaga no restaurante do mestre Paul Bocuse. Conseguiu.

Laurent já conhecia a fama de Bocuse, de ser um homem muito exigente e detalhista. Era uma divindade para seus subordinados, que, no entanto, não escondiam o alívio quando o chefe se afastava da cozinha por alguns dias.

Logo o talento de Laurent foi notado. E, em 1980, Paul Bocuse ofereceu a Laurent Suaudeau uma missão que mudaria radicalmente a sua vida: o cargo de chef assistente no "Le Saint Honoré", restaurante da rede Méridien, no Rio de Janeiro.

Recém-chegado ao Brasil, desanimou-se com a qualidade do trabalho do pessoal de cozinha. Mas o estímulo de Bocuse e a descoberta de receitas e ingredientes típicos do país, como cupuaçu, manga, tucupi, maracujá, mandioquinha, fizeram o então chef assistente mudar de idéia. Em apenas um ano Laurent era o chef de cuisine do "Le Saint Honoré".

Laurent apaixonou-se pela riqueza e variedade de cores, aromas e sabores brasileiros. Começou então a desenvolver o que hoje pode ser uma nova escola de gastronomia. Além de criar receitas inigualáveis, criou raízes no Brasil, casando com a piauiense Sissi, com quem teve dois filhos, Janaína e Gregory.

Em 1986, abriu o seu restaurante no Rio de Janeiro, o "Laurent", que imediatamente foi considerado o melhor restaurante do Rio e também o melhor do Brasil pelo Guia 4 Rodas. Em 1991, transferiu o sucesso para São Paulo - mais uma vez tornando-se referência e ponto de encontro de intelectuais, artistas, empresários e demais apreciadores da que foi chamada a melhor cozinha francesa do país.

No final de 2000, decidiu interromper a atividade do restaurante para dedicar-se à sua escola de cozinha. Laurent Suaudeau adotou o Brasil, e quer deixar para os novos chefs brasileiros a sua herança culinária. Para isso, fundou a Escola das Artes Culinárias Laurent, que consolida um novo perfil de gastronomia e tem como intuito principal o aperfeiçoamento de chefs de cozinha e profissionais da gastronomia.. É a sua forma de agradecer ao país o respeito e o reconhecimento conquistados durante todos esses anos.

De maio de 2003 à dezembro de 2004, funcionou o Restaurante Laurent da Al. Lorena em São Paulo, que fez história; acumulou os principais prêmios da gastronomia em pouco tempo:
Revista Gula (Chef do Ano de 2003 e Melhor rest. frances de São Paulo de 2003 e 2004)

Revista Veja São Paulo (Chef do Ano de 2003, , Melhor sobremesa de São Paulo de 2003 e Melhor rest. frances de São Paulo de 2003 e 2004)

Guia 4 Rodas (Chef do Ano de 2003 e o restaurante recebe “Três Estrelas”, fazendo parte do seleto grupo de cinco restaurantes três-estrelas no Brasil)
Em 2004, Laurent passa a ser “Maître Cuisinier de France”, fazendo parte desta organização mundial destinada a abrigar os melhores chefs mundiais e lança seu segundo livro, “Cartas a um Jovem Chef”, dirigido à nova geração de cozinheiros, além de palestrar com freqüência à fornecedores do ramo e ao empresariado em geral.
Desde o fechamento do restaurante Laurent, o chef concentra sua alta gastronomia no Espaço Cultural Laurent, um espaço vip reservado para eventos pequenos, destinado a uma clientela selecionada e que funciona no mesmo local da Escola Laurent.





SÉRIE ARTE E SABOR

TRUFAS













INEBRIANTE NATURAL
A trufa é um fruto da terra conhecido de tempos muito antigos. Existem testemunhos da existência da trufa já em 1700-1600 a.C. Os gregos chamavam-na de 'hydon', os latinos denominavam-na de 'tuber' com raiz no verbo 'tumere' (inchar), os árabes 'ramech alchamec trufus', os franceses 'truffe', derivando do significado da representação teatral de Molière 'Tartufe' de 1664, os ingleses 'truffle' e os alemães 'Hirstbrunst' ou 'Truffel'. No século XVII já se organizam buscas de trufas, um divertimento palaciano para o qual cedo se escolheu um animal elegante como o cão para fazer a procura. No entanto, também o porco chega a ser utilizado com sucesso nesta procura. Muitos 'famosos' tinham na trufa um motivo de adoração: Alexandre Dumas definia-as como 'Sacra Santorum' do mês e Rossini como o 'Mozart dos fungos', Lord Byron tinha-as na secretária para que o perfume delas lhe despertasse a criatividade. Brillat Savarin defendia que as trufas deixam 'as mulheres mais carinhosas e os homens mais amáveis'.


Hoje em dia as trufas são motivo de leilão, atingem preços exorbitantes e ocupam o lugar de produto gourmet por excelência. Azeites trufados, molhos, conservas, manteigas, entre outros, tudo serve para aliciar os entusiastas - muitos deles fervorosos - deste túbero. A trufa é um fungo que vive sob a terra, precisamente em forma da túbero, constituído por uma massa carnosa revestida por uma cobertura. Apreciada pelo aroma e pelo sabor característico, a trufa possui proteínas, hidratos de carbono, água, gorduras semelhantes a outros fungos e com uma percentagem de água acentuada entre os 75% e os 90%. E, se o preço elevado leva a crer que a trufa possui elevadas qualidades nutricionais tal não acontece: é um alimento que pode ser consumido por pessoas de todas as idades.

A trufa é encontrada em maiores quantidades junto de árvores das quais absorve as características. A cor, sabor e perfume da trufa são determinadas pela árvore junto à qual se desenvolveu. Essas árvores são principalmente as seguintes: choupo, carvalho e tília. As trufas que crescem junto ao carvalho terão um perfume mais intenso enquanto as que crescem junto à tília serão mais claras e aromáticas. O seu perfume é uma mistura de alho, parmesão, musgo e gás. A forma, por sua vez, dependerá do tipo de terreno: a trufa é mais lisa quando o terreno é mais compacto e mais porosa se o terreno for mais irregular. No geral a maturação da trufa acontece no Outono, mas existem espécies primaveris. São conhecidas 32 espécies de trufas e apenas sete são consumidas, para os apreciadores existem somente duas, a d'Alba (Itália) e as do Périgord (França).A trufa preta onde nasce não deixa qualquer vegetação, o mesmo não acontecendo com a branca (cor de mármore sujo). A trufa branca difícil de encontrar, atinge neste ano de 2005, cerca de 5.000 euros o quilo.
















QUASE DOIS MILÉNIOS NA EUROPA
Durante quase dois milénios, o centro da Europa era o núcleo comercial da trufa, no entanto estava anteriormente presente em muitas culturas da época pré-histórica. Segundo os antigos Romanos as melhores trufas encontravam-se na Grécia e na Líbia e, para Bartolomeo Paltina, médico no ano de 400, já se encontravam em África, Síria e também na Grécia. No Oriente crê-se difundida na China e no Japão e presume-se que mesmo os nativos americanos conheceram a existência da trufa, mas não existem provas contundentes. Na Europa eram famosas as da Provença - Périgord da Borgonha. Na Alemanha descobriram-se, no ano de 700, nas zonas de Brandenburgo e Saxónia e, em Itália, a trufa preta estava presente em quase todo o território, sendo todavia criado um mercado internacional nos anos 800, sempre em seguimento da França. Este discurso gera divergências entre Itália e França, como acontece com os vinhos também, porque se do ponto de vista comercial a trufa estava vulgarizada em França e em Itália, no baixo Piemonte, na época medieval, a trufa branca era já considerada como fundamental na alimentação entre as famílias nobres. Piemonte é, desde há muito, de facto, uma região onde o consumo é uma realidade e se os franceses procuravam mais a trufa preta, em Piemonte o consumo da trufa branca já era fortemente vulgarizado. Durante largos anos julgara-se que a trufa, por estar próxima dos cogumelos podia absorver o respectivo veneno. Na Europa do passado a trufa chegou a ser apelidada de 'alho dos ricos' pelo sabor e naturalmente porque se encontrava em abundância. Todavia, também é referido, por vezes, que Piemonte começou o consumo imitando os hábitos franceses que já utlizavam as trufas nas carnes e peixes. Bem, a paixão gastronómica que despertam as trufas explica estas 'picardias' e deve-se em grande parte aos perfumes que estas emanam. As diferenças botânicas entre a trufa negra e a trufa branca são mínimas, no entanto, na cozinha as duas distinguem-se claramente segundo um príncipio essencial: a trufa preta é consumida em quantidade enquanto a trufa branca é mais um aromatizante que transmite sobretudo um perfume e que é empregue em doses mínimas. As outras diferenças são que a trufa preta é consumida cozinhada e a branca quase exclusivamente crua, ralada directamente sobre o prato. As trufas brancas são uma 'benção' quase exclusiva em algumas regiões de Itália, sobretudo Piemonte, Emiglia Romana, Marche Umbria, Abruzzo, Molise, Basilicata e Calabria, nestas regiões também é possível encontrar a trufa preta. Apelidado de 'tartufaio', pelos italianos, o cão 'trufeiro' experimenta a sorte de ser treinado para encontrar o precioso túbero. O 'tartufaio' é treinado para agir dentro do respeito absoluto da natureza. Depois de identificar a zona onde se encontram as trufas deve escavar e fazer a recolha das trufas.

Se a busca se faz hoje sobretudo com cães e já se fazia em 1.700 a. Cristo, também o porco chegou a ser utilizado nesta procura: no século XVI esfregavam as tetas da porca com um pouco de sumo de trufa e, sendo este um animal de faro privilegiado, conseguia encontrá-las, isto apenas se fazia com porcos de três meses a um ano.

Para escolher a trufa para já o perfume é primordial: se o perfume não chegar ao nariz mesmo á distância, poderá ser trufa velha ou originária da China, Eslovénia, ou até mesmo de outras regiões de Itália.A trufa preta tem uma aroma menos intenso que a branca, e até diferente, tem um aspecto de mármore negro quando cortada.O paladar é uma mistura de avelãs, castanhas, nozes e terra. A trufa preta é cultivável e leva uns oito anos a criar-se. A trufa preta vale menos cinco vezes o valor da branca.A trufa preta francesa é a melhor.



A conservação das trufas pode ser feita de várias formas. Convém utilizar um recipiente de fecho hermético para não perder o perfume. Antes de serem colocadas em recipientes devem ser limpas com uma escova de dureza média para eliminar a maior parte da terra e com um pano retirar o resto, tudo com delicadeza. Depois é cobri-las com arroz para não perderem a humidade e mantê-la constante, sendo recuperadas somente no momento do uso. Este arroz é depois utilizado para fazer óptimos 'risotti' devido ao facto de ter absorvido todos os aromas das trufas.

O 'TARTUFO D'ALBA'

Foi em 1929 que Giacomo Mora tentou, pela primeira vez, divulgar a trufa numa exposição na Feira d' Alba (Piemonte), mostrando as melhores trufas que cosneguira. O sucesso foi tal que decidiu continuar nos anos seguintes e naturalmente a adesão por parte dos visitantes foi crescendo. Em 1930 uma edição de 'The Observer' dedicou um artigo extenso à Feira d'Alba no qual a trufa ocupava um lugar de destaque. Em 1933 a Feira foi rebaptizada Feira da Trufa e, pela primeira vez, os vinhos locais como o Barolo, Barbaresco e Espumante Asti associaram-se ao produto trufa. A Feira foi inaugurada em 1936 por Umberto de Savoia e, em 1937, dura apenas três dias devido à Guerra. Em 1945 é retomada e, nos anos 50, tem por intuito promover os produtos de Alba, assim como as novas indústrias, actividades comerciais e agrícolas. As manifestações paralelas à Feira assumiram com o passar do tempo grande importância como, por exemplo, concursos de pintura ou reconhecimento de monumentos.


Um restaurador italiano, Giacomo Mora, teve um papel primordial na internacionalização da trufa, criando um verdadeiro culto em relação à trufa que resolveu chamar 'Trufa d'Alba'. Em 1949 no âmbito de um evento enogastronómico, resolveu oferecer a Rita Hayworth o melhor exemplar recolhido nesse ano. De então em diante o episódio repetiu-se, associado sempre a personalidades de relevo internacional, a saber: Harry Truman, Winston Churchill, Joe Di Maggio e Marylin Monroe, o Imperador da Etiopia Hailé Selassiè, o Papa Paulo VI, Sofia Loren, Alfred Hitchcock, Ronald Reagan, Gianni Agnelli, Gorbachov, Pavarotti, Valentino, o Príncipe Alberto do Mónaco, João Paulo II...